felipe alves avila

A primeira fotografia, nomeei de “descansar do gênero” um retrato de uma amiga artista no banheiro da casa dela, gosto muito de fotografar os corpos de forma que não consiga se definir o gênero. A segunda é “autoretrato anti-édipo” com meu pai, e escrevi sobre ela: “O homem tem prazer em domesticar, controlar, delimitar o espaço, mas o animal é selvagem, quer correr, se arriscar, se misturar com outras espécies. Na mitologia, o minotauro é um ser híbrido, metade bicho metade homem. Aos poucos tenho tentado me separar da figura do “homem” que é passada de pai para filho no contexto da sociedade heteropatriarcal, como uma despossessão. Também tenho pensado nas performances para as fotografias como um processo terapêutico que me ajuda a tratar traumas. No momento que a fotografia é feita, consigo sair do papel de filho. Nessa imagem, contei com a colaboração de Leonardo (meu irmão), que clicou a foto, e de Nelson (meu pai), que topou aparecer e emprestou “seu” cavalo. Chamá-los para participar da fotografia tem sido uma forma de trazê-los para próximo dos meus pensamentos, de me afirmar enquanto artista numa sociedade conservadora, e de fazê-los cúmplices do meu processo de transição para um corpo mais livre do gênero”. A terceira imagem, outro autoretrato, num momento muito forte de metamorfose, de encarar o medo da morte e buscar a transformação para renascer. Feita em 2020, quatro meses após a semana que se deu o início do isolamento da pandemia do covid-19 e que recebi o diagnóstico de hiv positivo.

Através da fotografia, tenho investigado a performatividade, a experimentação da corporalidade e o transe. Me interessa o registro, a performance para a câmera e a busca por outras possibilidades de estar com outras pessoas e se relacionar com a “Natureza”. Penso a fotografia como uma escrita autobiográfica e como uma ferramenta de criação com o real, e gosto de imaginar a narrativa das sequências de imagens, através de fotolivros e pensando no cinema. Busco a criação de um imaginário de corpos fora da binariedade do gênero, e acredito na potência de reencantarmos nossos corpos.